quinta-feira, junho 30, 2011

A imprensa também pode ser autoritária?

Retirado do Blog do Kotscho

Caros leitores,

a pedidos, reproduzo abaixo a palestra que fiz na tarde desta terça-feira no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo dentro do Ciclo de Debates sobre Direitos Humanos promovido pelo Instituto Vladimir Herzog junto com a Escola de Comunicações e Artes.

“O PAPEL DO JORNALISMO NO COMBATE ÀS VÁRIAS FORMAS DE AUTORITARISMO”

Bom dia ou boa tarde para quem já almoçou.

É a terceira vez este ano que venho fazer palestra na ECA, onde eu estudei nos anos 60 do século passado.

Fui da primeira turma, mas até hoje não concluí o curso, embora nele já tenha dado aulas.

Nem sei se ainda tenho alguma novidade para contar a vocês depois de tantas vezes que voltei aqui nestes anos todos.

Como não sei falar de improviso, trouxe apenas algumas breves anotações sobre o tema de hoje porque é muito chato alguém ficar lendo a palestra e mais chato ainda ouvir uma palestra lida.

Sobre o tema que me foi dado hoje, além de todas os fatos que vocês certamente já conhecem dos livros de História sobre o papel do jornalismo na época da ditadura militar no Brasil, gostaria de levantar um aspecto polêmico.

De tanto combater as várias formas de autoritarismo, parece que a imprensa passou também a praticar algumas delas _ a começar pelo pensamento único, que obriga todo mundo a rezar pela mesma cartilha conservadora, partidária e preconceituosa de muitas empresas da chamada grande mídia nacional.

A estrutura hierarquizada, a disciplina, os interesses e os dogmas das nossas grandes redações só podem ser comparados aos que vigoram nas Forças Armadas, que na época estavam do outro lado do front.

Pertenço à geração que combateu o Ato Institucional nº 5, também conhecido por AI-5, e hoje noto, com tristeza, em alguns manuais de redação e práticas profissionais, que tem muita gente ainda pensando e agindo como na época em que mandava quem podia e obedecia quem tinha juízo.

O pior é que a maioria dos profissionais aceita passivamente o prato feito do pensamento único, imposto de cima para baixo, sem discussão. Nem é preciso dizer o que pode e o que não pode ser feito em determinado veículo para conseguir e garantir o emprego. Está implícito.

É claro que me refiro ao espaço do noticiário e não à parte editorial, que é onde cada empresa pode e deve expor sua opinião.

Pois, no momento, temos dois tipos de autoritarismo: o das empresas, que querem editorializar o noticiário, de acordo com as suas preferências políticas e ideológicas, e a atitude arrogante de muitos jovens e velhos jornalistas, mais preocupados em dar e impor suas opiniões aos outros do que em contar o que está acontecendo.

O leitor fica sem saber até onde vai o noticiário e onde começa a opinião. Ainda bem que inventaram um negócio chamado internet para quebrar estes oligopólios dos donos da verdade e do saber.

A internet, que transformou todos nós em emissores e receptores de informações, é a melhor forma de combater as várias formas de autoritarismo dos velhos ditadores, como estamos vendo no mundo todo, e de democratizar a circulação de notícias e opiniões.

Formadores de opinião hoje somos todos nós e não apenas aqueles que vivem nos aquários das redações.

Sorte de vocês que não tiveram que enfrentar a ditadura militar e poderão agora desfrutar deste novo tempo de democracia e liberdade. Aproveitem.

Como conselheiro do Instituto Vladimir Herzog, símbolo daqueles tristes velhos tempos, cumprimento os organizadores deste encontro e me coloco à disposição de vocês para o debate.

Muito obrigado.

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